“Polícia é polícia, bandido é bandido”, ensinou ao Brasil dos anos 70  o delinquente Lúcio Flávio Vilar Lírio, um tipo raro de criminoso que  rejeitava ligações promíscuas com os homens da lei. Se tivesse  sobrevivido, ele ficaria certamente perplexo com a homenagem prestada a  José Sarney pelo Sindicato dos Delegados da Polícia Federal (Sindepol).  Investigador é investigador, investigado é investigado, diria Lúcio  Flávio ao delegado Joel Zarpellon Mazo, presidente do Sindepol.
Invocando os “bons serviços” prestados à instituição pelo presidente  do Senado, Mazo entregou-lhe a medalha Deferência Polícia Federal.  “Alguém só é considerado culpado depois do trânsito em julgado”, alegou.  “A medalha é concedida aos que fizeram e fazem pela Polícia Federal e  seus policiais”. O doutor está convidado a revelar que tipo de bom  serviço Sarney andou prestando. A julgar pelo noticiário  político-policial, o que mais tem feito o clã liderado por José Sarney é  dar trabalho aos agentes da PF.
“Tudo isso foi levado em conta pelo conselho ao escolher o seu nome”,  retrucou o delegado sindicalista. “Quem responde diante do Poder  Judiciário brasileiro não é o presidente Sarney, mas o seu filho, e isso  não se relaciona diretamente à pessoa dele”. Como se o primogênito  pudesse fazer com qualquer sobrenome as coisas que faz impunemente. Como  se o filho agisse agisse escondido do pai.
Os policiais que honram a instituição não podem perder a chance de  mostrar que o Sindepol acabou de encenar mais um ato do interminável  espetáculo da pouca vergonha. Basta confrontar o presidente da entidade  com as conversas telefônicas gravadas pelos colegas escalados para a  Operação Boi Barrica. Mazo ficará sabendo, por exemplo, que nos diálogos  em código travados por integrantes da quadrilha José Sarney é o “Madre  Superiora”, Fernando Sarney é o “Bomba” (ou “Bombinha”, ou “Madre”) e  Edison Lobão é o “Magro Velho”.
Saberá, sobretudo, o que a turma andou fazendo. E talvez entenda que,  se tivesse aprendido com Lúcio Flávio, não teria piorado o país com a  criação de outra brasileirice ultrajante: o investigado condecorado.
A gestação do tributo a Sarney pode ter começado em 20 de abril de  2010, quando Erenice Guerra foi condecorada com a Grã-Cruz da Ordem do  Rio Branco. Agraciada em 2005 com a medalha de Grande Oficial, a melhor  amiga de Dilma Rousseff esperou cinco anos para emocionar-se com a mais  alta honraria conferida pelo Itamaraty, um privilégio reservado aos que  “por qualquer motivo se tenham tornado merecedores do reconhecimento do  Governo Brasileiro, servindo para estimular a prática de ações e feitos  dignos de honrosa menção, bem como para distinguir serviços meritórios e  virtudes cívicas”.
Em setembro passado, soterrada por provas e evidências de que  reduzira a Casa Civil a um esconderijo da quadrilha formada por parentes  e agregadas, a companheira meliante perdeu o status de ministra, perdeu  a pose e perdeu a companhia permanente da Dilma. Mas manteve a medalha.  Desde quarta-feira, tem um argumento a mais para recusar-se a  devolvê-la. Pode exigir que Sarney devolva a dele primeiro.
 
 
 
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